Aquilo que você rejeita na vida tem muito mais poder em definir quem você é do que aquilo que você aceita.
Parece contraintuitivo pra caralho, né? Mas é uma verdade que estou experimentando na pele e que tem transformado completamente minha jornada.
MINHA LUTA COM OS "SIM" AUTOMÁTICOS
Vou abrir o jogo aqui: sempre fui péssimo em dizer "não". Sério mesmo.
Por anos, minha vida foi uma coleção interminável de "sim" — sim para projetos que não me empolgavam de verdade, sim para eventos sociais quando meu corpo implorava por descanso, sim para hábitos que eu sabia serem prejudiciais à minha saúde e paz mental.
"Vitor, vamos fazer X coisa?"
"Sim" (mesmo estando exausto)
No trabalho: "Pode fazer essa demanda extra?"
"Sim" (mesmo já estando sobrecarregado)
"Só um pedacinho não vai fazer mal, né?"
"Sim" (mesmo sabendo que nunca era só um)
Resultado? Uma vida aparentemente cheia, mas estranhamente vazia. Uma agenda lotada, mas uma alma desorientada. Um corpo presente em mil lugares, mas uma mente que não habitava plenamente nenhum deles.
A ESCULTURA DA VIDA
Semana passada, durante uma das minhas leituras, tropecei numa história sobre Michelangelo que me atingiu como arpão.
Quando perguntaram ao mestre como ele conseguiu criar o Davi — aquela escultura perfeita — a partir de um bloco bruto de mármore, ele respondeu algo que não consigo tirar da cabeça:
"Eu apenas removi todo o mármore que não era Davi."
Porra, que profundo! A obra-prima não surgiu através da adição, mas da negação — da remoção cuidadosa de tudo o que não servia ao propósito final.
Fiquei obcecado com essa ideia. E se nossa vida funcionasse exatamente assim? E se a grandeza não estivesse em acumular mais coisas, experiências e relacionamentos, mas em remover cuidadosamente o que não nos serve?
É nisso que tenho trabalhado nos últimos meses — esculpindo minha vida não pelo que adiciono, mas pelo que tenho a coragem de remover.
OS "NÃO" QUE ESTOU APRENDENDO A DIZER
Essa jornada não tem sido fácil. Cada "não" exige uma coragem que nem sempre tenho. Cada limite estabelecido traz aquela vozinha interna questionando: "Será que estou perdendo algo importante?"
Mas estou começando a perceber que cada vez que rejeito o que não me serve, abro espaço para que o essencial floresça.
Deixa eu compartilhar três "não" que estou tentando incorporar na minha vida — com todos os tropeços e recomeços que isso implica:
Não ao ruído digital nas primeiras horas do dia
Por anos, meu ritual matinal era patético: acordar e imediatamente mergulhar no tsunami digital — notificações, e-mails, notícias, stories, a avalanche interminável de informações alheias.
Há meses, decidi experimentar um "não" firme a tudo isso antes das 09h. As primeiras horas do dia agora são sagradas — reservadas para oração, planejamento e leitura.
Nos dias em que consigo manter essa disciplina (ainda falho pelo menos duas vezes por semana), a diferença na minha clareza mental é absurda.
Não a compromissos que não refletem meus valores mais profundos
Esse tem sido mais desafiador. Por diversas vezes recusei parcerias financeiramente tentadoras porque o produto não era algo que eu recomendaria à minha própria família.
Sempre fica aquela sensação de "será que fiz a coisa certa?" por dias, já que, a grana seria boa pra caramba.
Mas depois vem a clareza e paz interna que nenhum dinheiro poderia comprar.
Não a relacionamentos que drenavam mais do que acrescentavam
Essa foi a mais dolorosa. Tive que estabelecer limites com pessoas que genuinamente gosto, mas que sempre me puxavam para baixo ou para direções que não quero mais seguir.
Isso incluiu limitar drasticamente o tempo com alguns "amigos" que, toda vez que eu falava dos meus sonhos ou planos com Tayara, vinham com um balde de água fria ou com aquele ceticismo disfarçado de "realismo".
Esses "não" doeram pra caralho no momento. Cada um deles trouxe culpa, dúvida e aquela sensação de estar decepcionando alguém — principalmente a mim mesmo e àquela versão do Vitor que sempre quis ser tudo para todos.
A ESCURIDÃO QUE DEFINE A LUZ
Uma imagem que tem me guiado nessa jornada é pensar que, assim como a escuridão define os contornos da luz, aquilo que rejeitamos molda quem realmente somos.
Pensa numa pintura. O que dá forma e significado a ela não são apenas as áreas pintadas, mas também os espaços que o artista deliberadamente escolheu deixar em branco. É o contraste, a ausência intencional, que cria a beleza.
Da mesma forma, sem nossos "não", nossa vida seria apenas uma existência sem forma definida – um borrão de experiências, sem contorno, sem direção.
Essa metáfora me confronta diariamente. Cada vez que me pego querendo dizer "sim" a tudo, lembro que sem margens claras, não sou um rio poderoso – sou apenas uma poça d'água dispersa.
A LIBERDADE QUE ESTOU DESCOBRINDO NOS LIMITES
Uma das descobertas mais surpreendentes nessa jornada tem sido perceber que a verdadeira liberdade não está na ausência de limites, mas na presença de limites corretos.
Por anos comprei aquela ideia moderna de que ser livre era poder fazer qualquer coisa, a qualquer hora, sem restrições. Que ser "autêntico" significava seguir todos os impulsos e desejos.
Que ilusão!
A verdadeira liberdade que estou começando a experimentar (nos dias bons, pelo menos) vem justamente de ter clareza sobre o que não cabe mais na minha vida.
É como um rio que só consegue fluir com força porque tem margens que o direcionam. Sem essas margens – esses "não" naturais – o rio se tornaria uma poça de água parada, sem propósito e sem força.
A CORAGEM QUE AINDA ESTOU CONSTRUINDO
No fundo, dizer "não" exige uma coragem que estou tentando cultivar diariamente. A coragem de desagradar – a mim mesmo e aos outros.
É aceitar o desconforto temporário em troca de uma integridade duradoura.
E cara, como isso é difícil para alguém que passou a vida tentando agradar os outros, evitando conflitos, temendo rejeição.
Você tem mais medo de decepcionar os outros ou de trair a si mesmo?
A resposta parece óbvia.
Estou lentamente aprendendo que cada vez que digo "sim" para agradar alguém quando deveria dizer "não", estou essencialmente praticando uma pequena traição contra mim mesmo.
UMA JORNADA SEM FIM À VISTA
Essa não é uma carta de alguém que "chegou lá". É o relato honesto de alguém que está no meio do caminho, tropeçando frequentemente, mas determinado a seguir na direção certa.
Estou longe de ter dominado a arte dos "nãos". Ainda me pego dizendo "sim" quando deveria recusar. Ainda sinto aquela culpa idiota quando priorizo minhas necessidades. Ainda acordo no meio da noite com a ansiedade de ter decepcionado alguém.
Mas cada pequena vitória, cada limite estabelecido com sucesso, cada rejeição consciente do que não me serve – tudo isso tem me aproximado um pouco mais da versão de mim mesmo que quero ser.
Enquanto você reflete sobre isso neste domingo tranquilo, te deixo com uma pergunta que tenho feito a mim mesmo diariamente: quais são os "não" que você precisa dizer esta semana para abrir espaço para o que realmente importa?
Por fim, não é o que você persegue que define sua vida – é o que você se recusa a aceitar.
Que tenhamos uma semana abençoada.
Beijão,
IC XC NI KA
Vitor Fonseca